terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Os relâmpagos refletiam em seus olhos.


Estavam sentados jogando na televisão não muito popular dela
e grande; bêbados, um pouco
haviam voltado da festa de tarde
e passaram na casa da garota nesse meio tempo.
Ela queria mudar de roupa. "Vamos jogar enquanto não chega a hora de ir", "Ok"
A garota morena de olhos azuis vidrou na televisão e apertava os botões como numa sequência padronizada que decorou com o tempo
ele a assistiu jogar porque não sabia jogar
então preferia ver os outros jogando e rir de suas frustrações quando eles se davam mal no jogo.

Começou a chover forte
as grandes gotas de água batiam como pedras
no telhado transparente do jardim de inverno
da casa da garota de cabelos negros
trovões
raios
chuva carregada de cansaço do ano inteiro
estava esfriando
ela estava de regata branca
camuflando-se em sua pele branca
ele viu os reflexos dos tiros e explosões do videogame
nos belos olhos da morena
e sorriu para si mesmo.

Ela continuou vidrada com a boca meio aberta
dando-lhe um toque bobo e infantil
engraçadinho.

mais chuva
mais raios
não havia bebida.

KABOOM
Até mais, luz.
sua companhia foi agradável até agora.

escuro
o que iluminava agora era o cinza céu despencando milhares de litros de água
e o estrondoso jardim de inverno era a trilha sonora.

um olhou para a cara do outro
cara de idiotas
riram
os raios iluminavam seus olhos de gato
os dele não eram tão legais assim
mas enxergavam, o que era basicamente o necessário.

sentaram-se no sofá escuro e conversaram
sobre morte e vida após ela
sobre música, mulheres, homens, cosmologia
jogos, fotos, bebedeiras, doideiras, ruivas, chuvas...
chuva continuava e continuava
água escorria dos cantos que nem os cabelos lisos de uma cigana escorrem por seus ombros.

o tempo passou, eles não o viram chegar
estavam praticamente sóbrios
"Mas na festa tem mais", disse e sorriu debochadamente seu sorriso branco como a regata e como a pele .

deitaram cada um em um canto do sofá
seus pés estavam de frente um para o do outro
ficaram se encarando
minutos se passaram como cavalos em campos abertos
"Vamos na chuva mesmo" sugeriu ele
ela hesitou
"Foda-se então"

Foram até a porta e abriram-na
o dilúvio diante de seus olhos
olharam um para o outro e riram novamente
ficaram lá observando aquela água sem fim
os relâmpagos refletiam em seus olhos
ele encarou-a com um sorriso sem graça
ela não esperava quando se aproximou
uma mão foi em sua nuca, por trás dos cabelos negros
a outra em sua cintura
encostou-a contra o batente da porta
gentilmente
beijaram-se
um tanto quanto demorado
com as pequenas gotículas que rebatiam no chão umedecendo seus rostos e seus lábios rosados e grandes
ela sentindo o calor do corpo dele
com o frio molhado do batente da porta
afastaram-se
não falaram nada e ele sorriu para ela
ela sorriu envergonhada e ainda surpresa
ele não sabia aonde enfiar a cara
Mas valeu a pena.

"Vai", ele disse
pegou em sua mão e foram batendo de frente com a chuva quase fria
eles riam
a chuva berrava seus trovões para eles
a corrida e o riso esquentaram seus corpos
tentavam ir pelos lugares cobertos
mas eram poucos para muita chuva
muito chuva para qualquer coisa
mas estavam chegando ao metrô.

andaram, andaram, correram, coberto, corre, corre, carro joga água neles, xingamentos, risadas, beijo, corre, coberto, corre
Metrô.

Muitas pessoas lá, filas
o metrô estava sem luz, é claro
ficaram sem expressão
sem rir
o cabelo dele escorria água como a cera de uma vela ardente
os cabelos morenos da garota pingavam como se estivesse acabado de sair da banheira
e já começavam a enrolar lentamente
ela reclamou e ele disse apenas
"Deixa isso pra lá"

A noite começou a cair ao lado da tempestade
as luzes de fim de ano se acenderam uma a uma,
mesmo sem luz foram se acendendo uma a uma
por alguma brincadeira da luz
os dois se abraçaram com o frio
e ficaram sentados na entrada da estação
vendo as luzes laranjas, roxas, pisca, verdes, azuis, pisca, amarelas, vermelhas, pisca pisca pisca
essas também refletiam nos belos olhos claros da garota
e até um pouco nos dele, não tão legais assim
a regata ensopada dela deixava seu sutiã completamente à mostra
e ela se escondeu atrás dele, com vergonha dos transeuntes ensopados.

As pessoas saiam da estação putas
a luz tinha fugido de todos os lugares!
Eles estavam indiferentes
e agora esperavam se secar e a chuva cessar e a luz voltar e enquanto isso
não acontecia
eles se contentavam com os relâmpagos no céu
e as luzes de natal
e ele tinha o prazer que ela não possuía
de observar as luzes e os relâmpagos refletidos em seus belos e distraídos olhos claros.
Sorriu.

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