domingo, 19 de agosto de 2012

cinzeiro

Parado lá como se falasse com vibrações e dimensões
pombas voando sobre nossas cabeças
umas trinta delas
o frio e o vento rasgam nossas peles
enquanto duas belas garotas passam por nós e não nos percebem,
ele com sua arte
parado como estátua, estudando o movimento
de tudo
eu com um caderno e minha cara de matusquela
A praça está cinza, as árvores estão cinzas
os portões e os carros
tudo cinza, a cidade é cinza
               como uma gigantesca sinfonia monótona
               um monstruoso fluxo de água com fuligem
                           [mas disso já sabiamos]
Há dois garis limpando a sargeta
com habilidade, talvez invejando as pessoas
trabalhando em cubículos
aconchegantes
imaginando como seriam suas vidas sem a dose diária de
cinzas
outras pessoas
arrumadas e cheirosas
hidratadas e aceitas
voam por nossos olhos como o
batalhão de pombos
fugindo da miséria
e da verdadeira poesia
passando reto e despercebidos por nós
garis, pombos, poetas, artesãos
sans-culottes
e pelo deja-vu de pombos podres
talvez sisntam inveja dos garis e dos artesãos
e dos poetas e dos pombos robóticos
por estarem nas ruas
do lado de fora do muro
ao invés de cubículos com as fotos da família e lembretes lembrando-lhes responsabilidades questionáveis.
O artista volta com café em suas mãos
e uma linda loira passa por nós, sem olhar em nossas caras,
o cinza colide em nossas faces
como o vento frio e cortante.

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