Não sabia o que era
beijar alguém há tanto que já simplesmente não fazia diferença
alguma. Via as pessoas andando saltitantes pelas ruas, com seus
relacionamentos saudáveis e sexo descompromissado para todos, menos
para um, e sentia urticária.
"Na outra vida
fui o bobo do vilarejo" – dizia
Alguns riam, alguns
não, alguns sentiam pena enquanto ganhavam um boquete embaixo da
mesa e exibiam seus pescoços manchados de roxo
Eu era chutado no
cu pela vira todos os malditos dias desde a hora que comecei a
existir, e já aceitava que seria assim para sempre. O mascote, bobo
da corte, o louquinho, palhaço. Afinal de contas, todos devem ter
alguma missão em suas vidas, algum objetivo notório e nobre, ou
algo baixo e insignificante.
Não sei em o que
eu me encaixava, nunca fui de encaixar em padrões, sejam eles
físicos, filosóficos, comportamentais ou qualquer outro. Apenas
observava e tentava estudar os loucos e os fracassados, me dando
conta de que no mínimo eu era um deles. No máximo eu era o porta
voz dos imbecis e dos chutados, seu Messias, uma admirável porção
de merda gordurosa e mal cheirosa.
A felicidade plena é
tão utópica quanto a definição de sociedade, e não somos feliz o
tempo todo, é claro.
Não somos felizes em
nem uma fração de tempo de nossas vidas. As pessoas nascem e morrem
e no meio de tudo isso tem suas almas devoradas e dilaceradas pelo
mundo todo, mas ainda dizem estar vivendo a completa felicidade
eterna.
A verdade, para mim,
é que a maior parte da porcentagem de nossas vidas é triste e
banal, e os últimos dez ou quinze por cento de alegria estão
espalhados ao longo de nosso tempo, em pequenas e quase
imperceptíveis momentos e situações, apenas o suficiente para não
cairmos na melancolia destruidora.
É a forma que o
universo achou para que a humanidade inteira não se mate e não
fique muito convencida de sia o mesmo tempo.
Mas é claro que há
falhas nessas duas adaptações
E claro que todos os
humanos pensam em se apagar ao menos uma vez na vida.
E a vida às vezes
parece tão vazia quanto a contagem de mulheres que tive
E mais
insignificante do que [eu]
o número dessas
garotas que sentiram algo por mim
além de risos e um
leve
arrependimento ou nojo.
Quanto ao resto da
vida, acho que talvez valha a pena viver e tentar sentir algo além
de emoções humanas e urbanas, além de catarradas e loirinhas ou
ruivas aconchegantes e quentinhas
talvez valha a pena
tentar
e encontraremos a
gozada fenomenal
que é a nossa
verdadeira
iluminação
e você não precisa
ser
nada
além
do que você já é;
açougueiro, artesão,
executivo
ladrão, genocida ou um
diminuto
palhaço.
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