"Ele tinha
bebido três garrafas de vinho, três garrafas de vinho branco, ou
duas de branco e um tinto seco...não sei, sei lá. Mas ele tinha
tomado muito álcool naqueles dias anteriores e já estava ficando
meio senil pelo cansaço do corpo e da mente fodida dele. Sempre
pensei que a morte da filha somado ao fato de a única mulher que ele
teve na vida larga-lo e sumir com o primo dele duas semanas depois
realmente foderam a cabeça do cara. Mulheres, né brow...você fica
louco de qualquer forma no final das coisas.
Enfim, sei que o
fígado dele já tava trabalhando mais que Cubatão todo aquele goró
e ele começou a cheirar pó pra não ter um coma alcoólico. Deve
ter achado mais garrafas ou saiu pra comprar e mamou tudo
rapidinho...cheirando cocaína pra cacete no processo, tudo aquilo,
sabe? Começou a detonar o quarto inteiro do hotelzinho chulé que
estava hospedado e devia estar vazio porque ninguém reclamou por
horas.
Ele sempre carregava
um revólver com ele, aqueles Smith & Wesson estilo Tex, manja?
Era fodona aquela peça. Uma vez ele levou geral pro sítio do pai da
ex mulher e trouxe a Smith junto com umas caixas de munição..saia
um fumacê desgraçado daquele cano...muito legal...ah, sim. Então,
ele carregava o revólver sempre na cintura, principalmente quando ia
no bar. Era doido varrido, doido de pedra. Mas nunca saia do sério
também, era bem calmo até bêbado e sabia maneirar bem quando
mandava coca pa nareba. Ninguém sabia bem porque carregava aquela
coisa, nem ele devia saber, mas vira e mexe ele levantava a camiseta
apertada na barriga e mostrava a coronha de marfim brilhando no sol
pro pessoal da mesa.
Bom, voltando ao
revólver no hotel com o cara bêbado e fodido. Depois de um tempo,
quando as drogas tavam acabando e o goró já era, ele começou a se
sentir mais no cu do mundo ainda e se desesperou de vez. Ligou pra
emergência e disse no telefone "Alguém vem aqui no hotel tal
na rua tal do quarto tal, que eu acho que meu vizinho se matou! Sim!
Ouvi um tiro e uma coisa pesada caindo no chão..ele tá todo fodido
na cabeça, sabem? Sim, sim...venham o quanto antes." Ele
conseguiu fazer a voz parecer sóbria a ligação inteira e desligou
o telefone, acabou com o que tinha da droga e tirou o revólver da
gaveta. Não tirou da cintura porque o cara estava peladão no quarto
há dias...gostava disso...bom, ele engatilhou a arma e colocou o
cano na boca. Imagina aquela coisa gelada na sua guela....ahhh...só
de pensar dá agonia, bicho. Ele esperou passar um tempo, esperou a
cocaína vasculhar o último tanto de coragem que tinha dentro dele e
então puxou o gatilho."
"Cacete...que cu,
hein, cara...quem te contou essa história?"
"Ele que me contou
essa história"
"Ele que contou
essa história? Que porra? Ele não morreu com um tiro no céu da
boca?"
"Hahaha, não,
cara. Quando a ambulância chegou eles já entraram no quarto com o
saco preto para corpos já aberto, toda aquela meleca de pedaço de
rosto era bem asquerosa...até que um dos caras teve a formalidade de
ver se ele tinha pulso e voìla! Ele estava vivinho ainda. Ele não
acertou o cérebro, sabe? A arma recuou e destruiu toda a cara dele.
Explodiu o nariz, a boca, um dos olhos e todo o conceito que ele
tinha sobre azar na vida. Fui encontrar com ele no hospital e vomitei
por dois dias depois...ele conversava comigo pelo computador,
digitando a história toda. As lágrimas caíam só de um dos olhos
dele, o resto tava tudo enfaixado e sujo de sangue...o indivíduo não
tem mais nenhum motivo pra viver nessa merda de agora em diante...tá
na mesma porcaria de antes só que hoje com a pior dor da vida dele e
a cara monstruosiada. Tá fodido.
"Puta-que-pariu"
"Eu sei,
cara...foda"
"Tem gente que
nasceu pra se foder mesmo. Por isso nem reclamo mais"
"Nem eu. Quer ir
beber?"
"Vamos"
Foram.
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