sexta-feira, 19 de abril de 2013

23:45



Ela anda pelos túneis cinzentos subterrâneos
e as poucas pessoas passam umas pelas outras como almas desatentas
e desumildes.
Ela anda apressada, apressada mas com classe por eles, usando seu casaco vermelho forte
seu batom vermelho forte
seu cabelo naturalmente vermelho.

Ele caminha com as mãos nos bolsos e o olhar frio.
Não há moral em seu ser, seus conflitos não o fazem precisar
se identificar, sem escolha
ele não tem o que fazer.
Ele enxerga a garota de vermelho e todas as outras ficam em preto e branco.
O homem de chapéu cinza escuro e jaqueta preta conecta sua alma à da moça.
Ou isso é o que ele pensa.
Ele a quer em sua cadeira, amarrada.
Ele está atrás de caça.

As pessoas passam por ele, ele esbarra em algumas delas.
Não percebe, não dá bola, o vermelho brilha em suas pupilas contraídas .
Seus olhos fitam o objeto de desejo de seu inconsciente.
Inconsciente que agora parece ter dominado o consciente
e se tornado toda a sua consciência.
Indiferente.

A moça de vermelho segue parada na escada rolante, descendo lentamente para o seu destino.
Ela sabe que é centro das atenções, seu cabelo e seus modos sempre demonstraram isso muito bem.
Ela sabia a impressão que causava.
E gostava de vê-los se matando por ela.
Ela anda despreocupada,
e na espera de ser caçada
preparando sua chutada
para mais uma alma machucada.

Ele está logo atrás.

A luz do trem vem como as luzes finais que você enxergaria em seu leito de morte.
O som irritante dos trilhos rangendo,
as campainhas
as conversinhas
os mapas e
os casais de adolescentes nos primeiros e últimos vagões
Ela não quer contato com eles.
Ele não quer contato com ninguém além
dela.

A porta abre.
Ela entra.
Ele entra.
Duas portas de distância
Cinco pessoas em todo o vagão.
Seu dia de sorte.
Seu dia de azar, doce.

Eles permanecem sentados, cada um em um canto
de frente um para o outro de certo modo.
Ele ainda não tirou os olhos dela desde a hora em que a viu.
Seu cérebro não registrou mais nada depois que fitou aqueles olhos e aquele cabelo
e aquelas roupas e andar.
O instinto foi igual ao de um felino furioso.
Ela ouve música e olha pela janela
Garoa e luzes.
Ela sente o olhar penetrante de um senhor de chapéu.
Talvez um velho safado e solitário.
Ela olha para ele, olha dentro de seus olhos por dois segundos
sorri com o canto da boca
e desvia o olhar logo depois, de volta para a
Garoa e luzes.
Ele sorri logo depois, seus dentes amarelos pelo tabaco.
Ela não teria a menor chance essa noite.

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