"É como ser
invisível e tudo o que eu faço é como se uma empregada doméstica
estivesse fazendo. Vivo soterrada e sozinha em casa, não perguntam
como estou, como me sinto, só querem saber se estudei e se não
estou grávida. De resto eu sou mais um peso, um obstáculo rumo à
comidade deles, não me querem por perto, não querem saber o que se
passa ao meu redor. Já não tento mais falar com eles porque eles
nunca tentaram falar comigo. Ele então parece ser obrigado a me
sustentar e tudo o que faz por mim é só para não ficar sujo com a
minha mãe. Talvez ela ainda tenha um pouco do instinto materno e
lembra de me alimentar e olhar minha cabeça de vez em quando, não
sei."
"Me sentia
distante e alheia à sociedade. Minhas notas continuavam altas mas
meus relacionamentos com outras pessoas pareciam cada vez mais
frágeis e superficiais. Perdia minhas bases e a minha figura materna
parecia tão distante quanto a paterna, mas eu morava com ela. Morava
com ela e ainda tinha mais interesse vindo por parte de meu pai, que
mora do outro lado da cidade. Eu passava metade das minhas tardes
dormindo ou olhando para o nada no meu quarto. Computador parecia
cada minuto mais insuportável e não respondia mais os meus amigos.
Ficava lá, deitada no escuro, apenas deitada na porra meu escuro."
"A primeira vez
que tentei me matar foi bem estúpida. Estava sozinha em casa porque
eles dois tinham viajado, tinham viajado da noite pro dia e me
avisaram através de um bilhete "Estamos em Boracéia, voltamos
no domingo, tem R$50,00 reais pra você passar o final de semana.
Beijos", era alguma coisa assim. Peguei o dinheiro e comprei uma
garrafa de vodka barata e tomei uma porção de remédios que achei
na cômoda de quando minha mãe achou que tinha depressão. Tomei
tudo e babi quase metade da vodka enquanto engolia os comprimidos.
Depois de uns quarenta minutos comecei a me sentir enjoada e
sonolenta, vi que aquilo não daria muito certo e que, na verdade, eu
não tinha coragem de fazer isso. Corri ao banheiro antes de
desmaiar, enfiei a escova do meu padrasto dentro da garganta e
vomitei tudo no espelho, toda aquela gororóba e comprimidos semi
digeridos escorrendo pelo meu reflexo esgotado e destruído. Desmaiei
logo depois e acordei com o gorfo pingando dentro do meu ouvido. A
escova dele eu passei uma água e guardei aonde sempre ficava."
"Deixei aquela
merda toda fedendo para que vissem o que estavam fazendo comigo.
Quando chegaram demoraram mais de cinquenta minutos para sentirem o
cheiro e irem até o banheiro, e na hora que tive coragem de dizer o
que aconteceu, disseram que eu queria chamar atenção e que meu
problema era com homem. Desisti dos dois e fui para o meu quarto
continuar naquela minha escuridão, olhando para o teto e imaginando
algum céu em cima de mim para me levar longe daquela casa, daquela
vida."
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