domingo, 25 de março de 2012

cinza como um tiro.

Jogávamos sinuca no bar perto do colégio,
algumas cervejas
fichas
estava sem dinheiro algum como sempre
uma gaita no bolso e talvez um celular bem velho; alguns já jaziam bêbados
se não me engano
lembro-me do tempo cinzento, com cara de fim de tarde
mas acredito que não fosse nem quatro horas ainda

havia saído de casa com alguma esperança, finalmente;
talvez o universo fosse cumprir sua promessa de me recompensar
ele havia me dito isso
e estava crente que tudo daria certo, as coisas até dão certo de vez em quando, sabem?

Eu esperava ansiosamente a chegada de Rachel, meu mais novo amor eterno
daqueles tempos;
talvez voltássemos, segundo diziam as previsões
mas o "talvez" na cabeça de um idiota vira certeza
na hora
não há um meio termo na cabeça dos mais românticos;
na mente deles há um certo positivismo quanto à isso, é triste
mas é assim que as coisas são e não são;

todos chegam, bebem, jogam, conversam
ela não dá bola, ok
todos bebem, ganham, riem
eu estou quieto
tento algumas piadas, não bebo muito
não tenho noção alguma em sinuca, estou sério;
mas ninguém repara
e continuam aproveitando o momento que estão tendo
de alguma forma estou aproveitando, olhando para ela
isso, de certa forma, bastava para aproveitar aquela tarde
sabendo que as coisas dariam certo no fim do dia
elas tinham que dar;

todos chegam, bebem, jogam, gritam, riem e vão embora
acho que essa é uma boa forma de se resumir o ciclo da vida como um todo;
é, é uma boa forma;

caminho em direção à estação com ela
mais alta do que eu
muito mais bela do que eu
mais inteligente e mais madura também
sou apenas uma criança com cabelo cumprido e ideias radicais ridículas
ouvindo rock n' roll oitentista e indo em shows perfumados com suor, testosterona e vômito;
paramos no farol e cobro uma coisa que ela havia prometido
ela sorri de leve, sem graça e sem vontade
beija meus lábios com um beijo rápido e seco
meio como um tiro, sim
que pega direto no meu estômago
e que me destruiria pelos próximos meses, lentamente;

vou com ela até a última estação
conversando sobre música, tatuagens, pessoas e etc
talvez ela tenha percebido que não estou bem
mas parece que se sente melhor assim
e aquela última estação demorou pelo menos nove horas para chegar;
ainda tinha uma esperança
ganharia o dia
o universo não faria isso comigo
ele havia me dito!

Na estação tivemos uma despedida rápida
nunca me lembrarei o que disse à ela nesse momento
apenas quando ela se distanciava novamente, sem beijo nos lábios, sem abraços
sem mãos por cima da calça
ou respiração ofegante
sem cinema com os amigos, sem mãos dadas pelas ruas, sem discussões bobas por ciúmes;
apenas ela se distanciando mais e mais, e pessoas por lá
alheias a mim e a ela, alheias a todas as outras
sinto uma pressão vindo de dentro dos meus olhos ao ve-la indo e digo
"rach...Feliz Ano Novo"
ela sorri sem graça, não me lembro se respondeu
talvez eu já estivesse sofrendo algum dano cerebral nesse momento
vira novamente e segue seu caminho;
continuo na estação mais um tempo, andando por lá desnorteado
como se tivessem jogado uma caixa de pregos dentro do meu crânio e sacudido violentamente
talvez tenha chorado um pouco, não me lembro bem.

A viagem de volta para casa foi quieta e introspectiva,
sentia uma grande parte da minha alma se despedaçando a cada segundo que passava
a cada metro que corria na minha frente
a cada voz que ouvia no vagão lotado;
o gosto do universo é estranho, cara.

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